terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Lideranças Femininas não têm vez na Imperatriz

Então, amigos, mais cedo eu postei sobre o desfile da Imperatriz Leopoldinense e a impressão pessoal que tive durante ele.
Procurei a xinguana Ysani kalapalo, grande representante de sua etnia, empreendedora, ativista social e uma das homenageadas pela escola de samba carioca.
Ysani, como sempre prestativa e amável com a imprensa, contou ao blog sobre como se sentiu no desfile.



Foi mágico! Nunca havia desfilado e me senti grata pela Imperatriz estar falando de algo que nós indígenas já batemos na tecla há muito tempo. Já conhecia o cacique Raoni e revê-lo é sempre muito bom. Ele é o nosso guardião, um homem muito sábio e toda vez que estou próxima a ele sempre  aprendo alguma coisa, como saber lidar com as pessoas e respeitar a visão de cada indivíduo.

Como foi sua preparação para o desfile em relação a fantasia?
Super tranquila pois o que usamos foi tudo nosso, como nos caracterizamos em nossa aldeia. Tudo muito natural e verdadeiro.

Embora tenha se sentido grata e honrada pelo convite, a xinguana nos contou que se decepcionou com algumas atitudes dos organizadores do desfile.

Queria falar sobre nossas lutas e reivindicações e como a Amazônia tem sido devastada nas últimas décadas, mas não me deixaram falar. Fiquei muito decepcionada. No dia da coletiva de imprensa só trouxeram os caciques homens e ignoraram totalmente as caciques femininas.

O que mais você não gostou?
Senti falta das lideranças femininas. A Imperatriz infelizmente só deu voz aos homens. Achei um pouco machista. Eu fiquei observando que só vieram umas poucas meninas para dançar. Ficou bem claro na minha visão de que os homens são para liderar e as mulheres só para ouvir e dançar. Isso ficou na minha cabeça e também na de outras mulheres que estavam ali comigo.

Ysani, não sei se foi realmente assim, mas tive a impressão que faltou diálogo com os indígenas presentes.
Sim. Eles(os organizadores) não me deixara falar na coletiva de imprensa. Raoni queria que eu falasse, mas os organizadores não me deram a oportunidade.
Também achei desorganizado, não nos deram muitas orientações, me senti como penetra, sem poder dar a nossa opinião e para falarmos tínhamos que pedir autorização até algum homem permitir que falássemos ou não. Me senti super chateada. Tinha que ter uma voz feminina xinguana pra falar lá.
Eu senti um machismo latente na pele. Eu sou uma ativista  e defendo a causa indígena há muito tempo e não me deram tempo de fala nenhum e eu fiquei como tradutora de alguns caciques que lá estavam.
Tinham que ter dado voz às mulheres xinguanas, mas não deram. Muito machismo mesmo. Meu pai também ficou bastante chateado, ele mesmo sendo homem queria que nós mulheres também falássemos. Mas não nos deram a oportunidade.


Quantos indígenas participaram do desfile?
Cerca de quarenta indígenas do Xingu. No carro que eu vim tinha onze.

Qual resultado você espera desse desfile?
Maior resultado que poderíamos esperar era criar esse debate  em torno da causa indígena, principalmente alertar as pessoas em relação ao "Monte Monstro"(Belo Monte). Que as pessoas não olhem o índio como o povo atrasado, sim como o povo que preserva e cuida da mãe natureza para todo mundo.



Cacique Raoni e o Clamor que vem da Floresta

Olá, amigos do blog, boa tarde! Como vocês estão?
Feriado prolongado de Carnaval e é sobre ele mesmo que vim falar, mais especificamente do desfile da Imperatriz Leopoldinense.



Como eu já tinha abordado em um post anterior, a agremiação carioca levou para a avenida o samba-enredo "Xingu, o Clamor que vem da Floresta", enfatizando a necessidade de se olhar mais para esses povos, de trabalhar a sustentabilidade e como o crescimento industrial desenfreado tem destruído a Amazônia... 
Linda a letra na interpretação de Arthur Franco e mais linda ainda a iniciativa da escola. 
Mas eu já imaginava que a passagem da Imperatriz seria ofuscada pelo conflito de interesses que isso implicaria. Embora exaustivamente seja falado sobre sustentabilidade, na prática significa minimizar drasticamente os danos causados pelas indústrias e fábricas no planeta, o que choca com a economia nacional onde o agronegócio é o responsável por 22% do PIB e 37% gerador de emprego no país.
A beleza do desfile é indiscutível, os carros, a história indígena, as cores, lendas, a garra de Ysani Kalapalo representando o Xingu... mas senti falta do brilho no olhar do cacique Raoni. A sensação que eu tive foi que ele embora estivesse ali com muito orgulho de ser o que é, também trazia no peito a convicção de que não surtiria o efeito desejado. Que após o carnaval toda aquela manifestação e explosão de sentimentos iria embora, amor de carnaval mesmo... Lembram dele? 
O indígena mato-grossensse que se destacou na mídia em 1987 e virou porta-voz dos assuntos ligados aos índios, opositor ao então projeto Belo Monte( citada "belo monstro" no samba da escola), foi tema de documentário, esteve com o rei da Bélgica, foi patrocinado pelo cantor Sting, apoiado por presidentes e até pelo Papa João Paulo II, enfim, tem uma longa história de resistência, luta e conquistas; O caiapó é responsável pela criação do Parque Nacional do Xingu, na Amazônia. Vale a pena dar uma conferida em sua biografia.



 Senti falta de uma ênfase no tema durante a transmissão do desfile, nos comentários...senti falta dos homenageados no final. Acredito que eles aceitaram a homenagem para que tivessem oportunidade de falar sobre as desigualdades sofridas por seu povo e reivindicarem os seus direitos.
O capitalismo abafou o clamor da floresta. Mais uma vez o homem branco perdeu a oportunidade de dar voz aos verdadeiros donos da terra, aos protetores naturais do planeta. 
Resta-nos, formadores de opinião, continuarmos engajados nessa luta para que não se extingua as etnias espalhadas pelo planeta e com ele toda sua diversidade cultural e as riquezas da natureza. 

sábado, 11 de fevereiro de 2017

Mina da Passagem

Grande parte do encanto de Minas Gerais está em suas minas. 
Embora nos livros seja ensinado sobre o trabalho do negro nas grandes lavouras, pouco se fala sobre o trabalho nas minas de  extração de ouro e pedras preciosas e sua fase áurea entre 1700 a 1780.


Das gemas de diamantes e ouros extraídos do Brasil, dois terços saíram de Minas, mais precisamente de Ouro Preto, Tiradentes, Congonhas, Mariana, Sabará, Diamantina e várias outras cidades do estado.
Embora ainda haja grandes mineradoras ativas, como a Morro do Ouro, maior do país e maior do mundo em céu aberto, localizada em Paracatu, município do Triângulo Mineiro, o encanto a que me refiro é em relação às minas inativas e suas histórias.
A Mina da Passagem fica a aproximadamente cinco minutos de Ouro Preto e é a mais antiga do Brasil e também a mais visitada do mundo. Ela faz parte do Ciclo do Ouro a partir do século XVIII.


Não há como ter um número exato de quantos africanos foram trazidos para o Brasil pois não existem registros precisos, apenas estimativas.
Segundo historiadores, calcula-se que cerca de 35.000 escravos trabalharam nas minas por causa da busca incessante de metais preciosos, principalmente ouro, esmeraldas e brilhantes. 
Eles eram a base da economia do Brasil e de seu Império colonizador.


As condições de trabalho eram péssimas e muitos não passavam de cinco anos nessa atividade. Ocorriam vários deslizamentos, afogamentos, soterramentos e também insuficiência respiratória.
Uma forma de saber se havia oxigênio suficiente para os trabalhadores, era colocar um pássaro na gaiola perto deles, se caso ele morresse era sinal de que estava com escassez de ar.
Também havia a questão do esgotamento, pois eles eram obrigados a trabalhar de 12 a 16 horas diárias. Sua alimentação era a base de angu com cachaça, assim se esqueciam do tormento físico e mental no qual eram submetidos.



Este é o maquinário original que faz a descida do trolley(espécie de trenzinho), até as galerias subterrâneas da mina. Ele se encontra em ótimo estado de conservação.



Confesso que senti medo, pois embora já tivesse visitado a mina Jeje em Ouro Preto, tinha entrado caminhando, por isso a apreensão inicial.






Quando mais descíamos mais se fazia necessário a iluminação artificial... Em menos de quatro minutos já estávamos no interior da mina.



Segundo o nosso guia, o ouro encontra-se junto ao quartzo ou à pirita, também metais.


Há um lago natural, onde também é possível mergulhar com os equipamentos apropriados e somente para quem tem curso de mergulho profissional.


É impressionante o interior da mina com suas galerias.


Estima-se que desde a sua fundação tenha sido extraído cerca de 35 toneladas de ouro.
Esta é uma máquina que era usada para bombear a água. O chão da mina é muito úmido.


A mina passou por vários donos e muitas tentativas
de voltar a extração, até se tornar ponto turístico 
aberto a visitação.


A origem de seu nome tem controvérsias: de acordo com a lenda alguns afirmam que surgiu devido a
estreita ponte de cordas próxima a casa de uma mulher chamada Mariana. Outros afirmam
que ali naquele local era a passagem onde era cobrado um tributo aos usuários das pontes locais.







Outra lenda que ronda a Mina da passagem é a do capitão Jackes, conta-se que esse capitão inglês foi morto em uma explosão ao tentar explorá-la e que seu corpo nunca foi encontrado. 


Segundo contam, ainda hoje seu espírito vagueia pelas passagens subterrâneas.



 Lendas a parte, o local é um museu de história viva e não tem como não se emocionar.